terça-feira, 10 de junho de 2014

SUPERPORTO NO URUGUAI


26/05/2014 - Fernando Varella é economista e diretor da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica (Protec)

A construção de um superporto no Uruguai vem chamando a atenção da mídia brasileira nas últimas semanas. A obra a ser realizada na localidade de Rocha, na costa atlântica daquele País, poderá transformar a região no maior hub portuário do Hemisfério Sul. Contribui para tal situação, a localização privilegiada, para acesso à Ásia, via Estreito de Magalhães e o Pacífico Sul. Outro diferencial seria o considerável calado do futuro porto que tem previsão de custo de R$ 1 bilhão, com financiamento do BNDES.
 Preferencialmente, investimentos públicos devem ser realizados no território nacional de cada país, retendo os benefícios sócio-econômicos gerados. Outra razão seria evitar-se toda a sorte de problemas, como é o caso de outro superporto inaugurado, recentemente, em Cuba, cuja instalação recebeu financiamento brasileiro, de perto de R$ 1 bilhão, também do BNDES. Além dos benefícios relativos à geração de emprego e renda, Cuba não assegurou ao país financiador nenhuma forma de controle sobre o superporto. Se o governo cubano decidir deixar de pagar o financiamento, o Brasil não terá a quem apelar, uma vez que aquele país não participa da maioria dos organismos internacionais.
 Questiona-se o interesse nacional na obra, uma vez que os países do Caribe, com exceção do México, não têm expressividade no comércio exterior brasileiro. Daí o único mercado de expressão na região são os estados do Sul dos Estados Unidos. Mas, o caminho para os exportadores brasileiros venderem mais para aquele país, não seria através de portos cubanos, isto em função das sanções econômicas que os vem impondo à Cuba.
 Além disso, o PIB brasileiro não cresce porque os investimentos não têm sido suficientes. O nível do investimento público do país é muito baixo, embora as receitas dos três níveis de governo não parem de crescer. Para crescer acima de 3% ao ano, seriam necessários investimentos acima de 23% do PIB, algo em torno de R$ 1 trilhão/ano. Contudo, o Brasil continua gastando mal e errado. As despesas correntes têm aumentado muito, não sobrando recursos para investimento. Somente os juros da dívida pública federal, em 2014, devem alcançar o patamar dos R$ 250 bilhões, algo como 20% do total da receita federal prevista para este ano.
 O plano de modernização dos portos brasileiros encontra-se travado pela falta de recursos. Então, como entender que existam recursos para investir em portos de outros países, os quais acabam se transformando em concorrentes dos portos brasileiros. Portos e ferrovias que contribuem para a falta de competitividade dos produtos brasileiros de exportação. A situação das ferrovias do país identifica o sucateamento da malha, com impactos negativos na competitividade dos produtos nacionais de exportação. Como exemplo, o absurdo que acontece no trecho Cascável à Paranaguá, no Paraná, um dos grandes produtores agrícolas do país. O trecho tem 730km de extensão, leva até 7 dias para ser percorrido. O que nos leva a perguntar, se o governo dispõe de R$ 1 bilhão para investir no porto do Uruguai, porque não investe mais na infraestrutura do país?
 Alguns setores entendem que o projeto do superporto do Uruguai pode se encaixar perfeitamente, na perspectiva de integração das economias do Mercosul. A concorrência, em princípio, é sempre bem-vinda. Mas, para tanto, é preciso haver igualdade de condições. Os portos uruguaios não estão submetidos ao arrocho tributário e à asfixiante legislação trabalhista brasileira, que encarecem, sobremaneira, os fretes e os custos dos portos e ferrovias no território nacional.
 No âmbito do Mercosul, ainda, é absolutamente inepta a postura do nosso governo que oferece, o tempo todo, vantagens de todos os tipos aos países politicamente, alinhados, como Bolívia, Equador, Venezuela, Cuba e Argentina, misturando ideologia com negócios. A Argentina, por exemplo, deita e rola o tempo todo, desrespeitando as regras do próprio Mercosul, criando óbices de todo o tipo à entrada de produtos brasileiros no seu território. A reação do governo brasileiro é nenhuma, tratando o assunto com benevolência demais.
 Do mesmo modo, o governo federal mantém-se imóvel, assistindo, passivamente, a invasão de produtos chineses, de todos os tipos. O volume de entrada desses produtos é tão grande que as mercadorias made in China já respondem por 90% de todo o nosso comércio ambulante. Por causa disso, o déficit comercial do país alcançou US$ 93 bilhões, em 2013, considerando-se somente os bens de alta e média-alta intensidade tecnológica, com exportações de US$ 49,6 bilhões e importações de US$ 143 bilhões.  As autoridades demonstram que não sabem lidar com o assunto, mostrando uma postura permanente, de indecisão, mesmo reconhecendo que a sua inércia gera um mega prejuízo ao país.

Fernando Varella é economista e diretor da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica (Protec)

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