segunda-feira, 5 de maio de 2014



ÁGUA ALÉM DA CONJUNTURA - PARADIGMAS DE GESTÃO LOCAL E GLOBAL

Dr. Walter TeschSecretario Executivo do Conselho Estadual de Recursos Hidricos na Secretaria Saneamento e Recursos Hidricos


CONTEXTO: ESTADO DE ATENÇÃO 


No Brasil, ao se falar de falta de águam se apresenta à memória o nordeste. Na nossa história, prevalece a cultura de matriz extrativista. Bastava andar com uma forquilha (teoria da radiestesia), onde ela apontasse se fazia-se o poço e a água jorrava. Ainda hoje, em muitos lugares a solução proposta para a escassez é a mesma, vamos fazer um "poço artesiano". Contudo, a ocupação e usos do solo mudaram (a população há 100 anos era de 1.5 bilhão, hoje mais de 7 bilhões), e sabemos que abaixo de 40 metros do solo, conhecemos muito pouco do ambiente onde vivemos. 



O estudo das mudanças climáticas, realizado por milhares de cientistas mostra, como vimos no Amazonas, secas ou nas enchentes nunca antes vistas que o problema é grave. O tema é de segurança da espécie humana e não do planeta. Isto mostra a necessidade de mudança de atitude cultural, a questão não é só da esfera técnica e de especialistas, é de sociedade e exige passar de uma gestão passiva, reativa às crises como tem sido em nossa cultura, para uma gestão estratégica e proativa de prevenção de riscos e envolvimento de todo cidadão para um “segurança social ativa”. Para isto é necessário que se torne um tema permanente da “agenda da sociedade” não vulnerável aos humores políticos conjunturais e muito menos de manipulação oportunista marqueteira do bode expiatório. 




O Nordeste enfrentou em 2012 e 2013 a maior seca dos últimos 50 anos, com 1.400 municípios em estado crítico e de emergência e o sudeste, especialmente a macrometropole paulista, sofre em 2014 uma estiagem inédita. Maior estiagem, mais calor, maior demanda de água, mais evaporação, impactos na agricultura, na energia e abastecimento público. Portanto um fenômeno que envolve a sociedade e governos das diversas esferas em seu conjunto. 


O fenômeno não é isolado. Nos Estados Unidos, 2012 foi considerado o ano mais quente desde que se registros, estendendo-se seus efeitos até 2014. Na Austrália, África, México, China, Índia, Rússia e Sudeste da Europa, eventos extremos e efeitos colaterais de desertificação e degradação do solo acompanham o processo. Segundo o painel do clima (IPCC) e a organização mundial meteorologia o tema vai além da conjuntura e um desafio internacional de coordenação e metodologias integradas de gestão. 


Não bastasse isto, a rede mundial de monitoramento da temperatura do oceano pacífico aponta que em 2014 existe mais de 50% de possibilidades que o retorno de El Niño afete o Brasil. A Austrália que enfrenta uma das piores secas da sua história já adotou a previsão de 70% de possibilidade de o El Niño afetar o país. Se acontecer como 1997-98, o efeito do El Niño se apresentará diverso nas várias regiões do país, umas com secas, outras com tempestades extremas.


A crise da água em muitas regiões é um alerta e uma oportunidade para debater sobre a viabilidade do modelo de convivência e estabilidade social. É importante ao analisar o cenário hídrico da macrometropole paulista considerar algumas variáveis estruturais condicionantes que excepcionalmente ingressam nas análises ou são questionadas. 



O único técnico político que ousou colocar o tema foi Figueiredo de Ferraz quando expressou que São Paulo deveria parar de Crescer. O tema dos limites de crescimento ou expansão urbana da capital de São Paulo é um problema de Estado, Figueiredo Ferraz ao abordar sofreu forte pressão de múltiplos interesses e foi excluído do governo . O “modelo urbano concentrador de população”, que anda junto com um “modelo político e social” tem a ver com uma idéia de desenvolvimento que produz insanidade, desestabilização ambiental, incremento da violência paralelo á concentração de capital junto com a elevação do gasto publico que motoriza um estilo de ação política e um conceito de gestão publica de “atendimento à demanda imediata” sem questionar a natureza do modelo de organização e funcionamento da sociedade. 

Se considerarmos o crescimento anual de 1% da população, só o município de São Paulo cresce em população o equivalente a uma cidade de 120.000 habitantes ao ano, se ampliarmos o espaço de 50 mil km2 que envolve os 180 municípios da macrometropole teremos um incremento de 350.000 a cada ano. Isto significa a provisionar novas habitações, ligações de água tratada, coleta e tratamento de esgoto, resíduos, alimento, educação, transporte, saúde, emprego, etc. Esta é uma das razões da sensação de que os serviços públicos sempre estão colapsados.

Não se avizinha no horizonte nenhuma “guerra climática”, contudo é importante que os atores envolvidos na gestão dos recursos hídricos evitem a judicalizar o tema água. Esta atitude peculiar da cultura nacional tem contaminado a política e até o futebol. No caso da água, expressaria a antítese da metodologia de negociação e de tudo que se prega para a gestão pactuada dos recursos de uso comum que exige respeito, confiança e pluralidade democrática em base a conhecimento técnico e informações objetivas para a tomada de decisões. Método este válido tanto nas relações com águas subterrâneas interestaduais como as transfronteiriças.

Fonte: Linkedln (Maio, 2014).

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